Acompanhamos a influência da tecnologia na medicina veterinária há mais de 30 anos. Nossos primeiros atendimentos clínicos foram registrados em planilhas do Lotus 123 e em arquivos de texto escritos em PCs como o 286, equipados com um monitor de fósforo verde.
Presenciamos o lançamento do Windows, a chegada da internet e o aparecimento dos primeiros celulares. A miniaturização dos componentes e o aumento da capacidade de processamento e armazenamento de dados abriram o caminho para novos lançamentos, que ocorrem em espaços de tempo cada vez mais curtos.
Mas qual o atual estágio da tecnologia e como seu avanço impactará a medicina veterinária no futuro? Em primeiro lugar, é importante entender que a tecnologia da informação (TI) não se resume a sistemas de gestão de clínicas veterinárias que o veterinário opera a partir de um notebook ou celular, ou à implementação de ações de marketing digital nas redes sociais.
A informática está presente nas universidades, onde o professor, além de ter que passar seu conhecimento, passou a atuar também como um guia, indicando os melhores caminhos em meio a um universo de websites e plataformas de EAD.
Os equipamentos de suporte ao diagnóstico como os aparelhos de ressonância magnética, ultrassons e eletrocardiógrafos têm capacidade de processamento similar à de um computador e estão conectados à internet. Como resultado, temos um diagnóstico mais rápido e preciso, um tratamento mais eficiente e uma montanha de dados gerados e armazenados em nuvem.
Quebrando paradigmas na educação
Modelos 3D interativos estão ganhando cada vez mais espaço nas universidades, com destaque para a disciplina de anatomia. O sucesso dessa nova ferramenta no ambiente universitário tem despertado o interesse das empresas de tecnologia, que já estão reposicionando seus orçamentos com o objetivo de conquistar esse mercado.
A empresa LlamaZOO, sediada no Canadá, estabelecida no setor de mineração, desenvolveu o sistema EasyAnatomy (www.easy-anatomy.com/) e vendeu sua ideia para várias universidades de veterinária pelo mundo. Professores e alunos aprovaram a iniciativa e relatam uma melhora significativa na fixação do conteúdo apresentado.
Em poucos anos, os estudantes terão suas aulas de anatomia em casa, usando óculos especiais que permitem a visualização de modelos 3D em projeções holográficas de alta definição, dando a impressão de que estão em uma sala de aula, podendo inclusive interagir com o professor e com outros alunos. Além dos animais de companhia, como cães e gatos, que já possuem vasta quantidade de modelos disponíveis, outras espécies também serão mapeadas em breve, promovendo uma verdadeira revolução no estudo de animais silvestres.
A internet das coisas e o consultório do futuro
O veterinário contará com computadores e celulares ainda mais rápidos, a conexão com a internet será mais estável, e a velocidade de transmissão de dados continuará crescendo.
Os equipamentos de suporte ao diagnóstico seguirão a tendência de queda nos preços e de facilidade de uso. As clínicas serão capazes de oferecer resultados imediatos, e a integração com sistemas de gestão do prontuário eletrônico dos pacientes será ainda mais natural.
A internet das coisas (ou internet of things – IoT) estará presente em todos os equipamentos da sala de atendimento. A InPulse Animal Health, com sede em Florianópolis, SC, é uma pioneira na aplicação de IoT em soluções para veterinários. A empresa desenvolveu um eletrocardiógrafo portátil que pode ser usado a partir de um celular, e envia o traçado a um especialista para a elaboração do laudo.
Impressão 3D na ortopedia veterinária
Na última década, a impressão 3D passou de um processo especializado extremamente caro para uma ferramenta acessível, e sua aplicação em medicina veterinária tem aumentado nos últimos anos, principalmente na área da ortopedia. Modelos tridimensionais de ossos de animais são criados a partir de um protótipo gerado com base em imagens coletadas nas tomografias computadorizadas, permitindo que veterinários e cirurgiões tenham uma compreensão bastante precisa da estrutura óssea ou muscular interna de um paciente antes de entrar em cirurgia.
A tecnologia está ajudando também os animais silvestres, como as tartarugas que tiveram parte do exoesqueleto danificadas. Nesses casos, a impressora 3D é usada para criar uma peça exatamente igual à parte comprometida, que então é fixada ao corpo do animal.
Quebrando paradigmas
Não vemos espaço no futuro próximo para tarefas como ir ao banco ou enviar documentos via correio. As impressoras já não são mais necessárias. Gerar documentos com base em modelos preexistentes e em dados do prontuário eletrônico do paciente é muito mais rápido, e eles ainda podem ser assinados digitalmente.
Outro paradigma que será quebrado em breve está relacionado à maneira como o veterinário registra a anamnese. Escrever um texto usando o teclado será coisa do passado. Os sistemas de gestão serão equipados com recursos de reconhecimento de voz, tanto para acionar um determinado comando quanto para transformar o texto falado em texto escrito.
Softwares desenhados para aprender com os veterinários
Os veterinários usarão cada vez mais os sistemas de gestão para estabelecer tratamentos mais eficazes. À medida que as bases de dados são alimentadas com protocolos e guidelines estabelecidos pela comunidade científica, os sistemas ganham poder para correlacionar diagnóstico e tratamentos. O crescente uso da inteligência de máquina (ou machine learning – ML) permitirá ainda que os sistemas aprendam e passem a sugerir tratamentos, informando ao usuário as chances de sucesso de uma terapia específica.
Usuários do VetGo, o sistema de gestão de clínicas veterinárias da NetVet (www.netvet.com.br/vetgo), contam com um recurso que realiza o cálculo de doses que devem ser administradas ao paciente. O sistema utiliza dados do prontuário, como espécie e peso vivo, e informações fornecidas pelos fabricantes de medicamentos e suplementos alimentares. Em janeiro de 2020 começamos a alimentar o banco de dados com informações de fármacos e quantidades recomendadas para cães e gatos. O próximo passo é a padronização dos diagnósticos e a implementação de algoritmos de inteligência artificial para criar recursos de suporte ao diagnóstico.
Os sistemas inteligentes e o aprendizado de máquina podem causar uma certa sensação de desconforto entre os veterinários, criando uma ideia de que as máquinas podem tomar o lugar das pessoas, mas o fato é que as novas tecnologias estão tirando os profissionais da zona de conforto, levando-os a aprender a lidar com ferramentas mais complexas. Os dados continuarão sendo coletados por veterinários a partir do exame clínico do paciente, e as decisões mais importantes sempre estarão nas mãos deles.