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Direito médico-veterinário

A representação do advogado nos processos éticos ou judiciais que envolvam o médico-veterinário

A importância de uma estrutura jurídica competente

Matéria escrita por:

Fernando Leandro dos Santos

12 de fev de 2023

Crédito: AVN Photo Lab Crédito: AVN Photo Lab

Sob a égide do direito dos animais, que se encontra em franca expansão de regulamentação e conscientização da população, surge a indagação: o médico-veterinário está consciente das consequências administrativas e/ou judiciais de suas intervenções e é capaz de responder a isso de modo científico e claro? 

A fim de contribuir para a resposta, faz-se necessário dar um passo atrás para compreender o assunto. Primeiramente, é importante relembrar que a profissão está regulamentada pela Lei nº 5.517/68 e que seus artigos 5º e 6º listam as atribuições privativas e as compartilhadas com outras profissões. Nesse sentido, de imediato, é requisito básico ao diplomado e regularmente inscrito no Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) e nos Conselhos Regionais que conheça os termos da lei que definiu, entre outros assuntos, a atribuição profissional, e, por sua vez, os deveres e direitos, entre outros, regulamentados pelo Código de Ética do Médico-Veterinário, Resolução do CFMV nº 1.138/2016. 

Em tese, isso deveria ser suficiente para, delimitando a atuação, o profissional responder à proposição; porém, o que se tem como fato é que a formação acadêmica (assumindo que seja de qualidade para a consecução dos objetivos) pode atender à qualificação técnico-científica (competências e habilidades), sendo contudo insuficiente para dar-lhe base para defender-se. 

Do ponto de vista científico e do exercício profissional, o avanço da ciência (seja bem-vindo!) revela melhor compreensão sobre os fatos ou fenômenos fisiológicos que fazem parte da vida. Se isso é bom, por outro lado, traz uma zona de sombreamento sobre as escolhas, o que, em se tratando de atuação profissional definida no Código de Ética que dá o direito ao profissional de escolher o tratamento mais apropriado, é por demais preocupante – pois o ato ou a escolha podem ser questionados quanto à observância da conduta dentro de padrões éticos. Em conexão com esse ponto, é conveniente lembrar a “Reflexão sobre o ato médico veterinário”, de autoria do professor Antônio Felipe Paulino de Figueiredo Wouk, que chamou a atenção sobre a ovário-histerectomia com a finalidade de esterilização e questionou seu impacto e sua finalidade. Então, aproveitando o procedimento citado, pergunta-se: se ela for planejada e executada observando-se os requisitos técnicos (os procedimentos cirúrgicos, epidemiológicos, etc.) e legais quanto à utilidade e ao contexto de controle populacional, seria incluída na categoria de maus-tratos? 

Já antecipando a resposta, ou pelo menos uma delas – e colocando mais dúvida sobre o assunto –, pode-se dizer que, à luz da legislação (Resolução CFMV 1236, art. 5º), seria, sim. 

Por outro lado, a Constituição Federal de 1988 traz, nos artigos 196 e 197:

• Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. 

• Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros, e também por pessoa física ou jurídica de direito privado.

Assim, se aquela medida seria cabível em favor do interesse coletivo, a resposta até poderia ser sim. Mas o interesse coletivo se sobrepõe ao individual, e pode-se acrescentar, por exemplo, que ela é “necessária ao interesse coletivo como meio de reduzir riscos a doenças”, pois, no Direito, um aparente conflito de normas pode ser resolvido mediante o critério do interesse coletivo, que se sobrepõe ao individual. 

Como discussão epistemológica, maravilha; porém, como fica o médico-veterinário envolvido? Ele está preparado para esse embate administrativo e/ou judicial?

A Lei nº 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da administração pública federal, no artigo 3º, inciso IV, que trata do direito do administrado (servidor), estabelece que é facultada a assistência de advogado, exceto quando ela for obrigatória. Esse inciso, se não a define expressamente como obrigatória, sugere que a assistência jurídica é importante – de modo similar ao que se encontra na Resolução nº 1.330/2020 do Código de Processo Ético-Profissional, no âmbito do Sistema CFMV/CRMVs. Este último, no artigo 32, Capítulo da Defesa, parágrafo 2º, cita a possibilidade de o médico-veterinário estar representado “por procurador, advogado ou não” no processo, detalhe esse que o coloca em notória desvantagem.

Tudo isso parece óbvio, mas não é. A assistência de um operador do direito é, se não fundamental, importantíssima para que se produzam o contraditório e a ampla defesa.

Considerando que esses e muitos outros fatos ou situações já fazem parte do cotidiano profissional, são necessárias ações contundentes por parte do CFMV, de modo a lançar luz sobre a matéria, minimizando os impactos sobre o exercício profissional. Complementando as ações do órgão regulador, os médicos-veterinários devem reforçar suas posições, fortificando suas representações como categoria profissional para ter disponível estrutura jurídica capaz de representá-los quando em processos éticos e judiciais, sob pena de sofrerem impacto maior que o inevitável.

 

Referências sugeridas

01-BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Senado Federal, 2016.

02-BRASIL. Lei Federal n. 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. Brasília: Gov.br, 1999. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9784.htm>. Acesso em 6 de dezembro de 2022.

03-CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. Resolução n0 1236, de 26 de outubro de 2018. Define e caracteriza crueldade, abuso e maus-tratos contra animais vertebrados, dispõe sobre a conduta de médicos-veterinários e zootecnistas e dá outras providências. Brasília: CFMV, 2020. Disponível em: <http://ts.cfmv.gov.br/manual/arquivos/resolucao/1236.pdf>. Acesso em 6 de dezembro de 2022.

04-CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA VETERINÁRIA. Resolução n. 1.330, de 16 de junho de 2020. Aprova o Código de Processo Ético-Profissional no âmbito do Sistema CFMV/CRMVs. Brasília: CRMV-SP, 2020. Disponível em: <https://crmvsp.gov.br/wp-content/uploads/2021/04/1330.pdf>. Acesso em 6 de dezembro de 2022.

05-WOUK, A. F. P. F. Reflexões sobre o ato médico veterinário. Clínica Veterinária, ano XXVII, n. 159, 2022. ISSN: 1413-571X.

 

 

 

 



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