Internação – layout moderno para práticas seguras
A decisão de deixar um animal sob os cuidados do estabelecimento veterinário é baseada em confiança por parte do tutor
Outro momento tenso para qualquer tutor é a necessidade de internar o seu animal. A decisão de deixar um animal sob os cuidados do estabelecimento veterinário é baseada em muita confiança por parte do tutor, e isso traz ainda mais responsabilidade para o estabelecimento. Ressalta-se novamente a oportunidade de mostrar a preocupação do local de saúde animal com todos os aspectos, incluindo os ambientes restritos ao público. O fato de o tutor entender que a estrutura física dedicada ao cuidado do seu animal se baseia nos quatros pilares de um ambiente pet friendly – a saber: higiene, conforto, bem-estar e segurança – traz mais confiança nos procedimentos adotados e nos valores cobrados. Assim, a velha gaiola de metal não parece fazer muito sentido quando se deseja diferenciação e maior valor agregado.
Vale salientar que o oferecimento dos serviços de internação deve ser coerente com o espaço, os equipamentos existentes e a espécie animal. Por exemplo, não se pode oferecer uma internação a um paciente grave sem ter todos os equipamentos que caracterizem um monitoramento intensivo. Outro exemplo: é inadequado aceitar um animal silvestre e colocá-lo numa baia destinada a cães e no mesmo ambiente ocupado por outros animais de outras espécies, como por exemplo, predadores. Em ambos os exemplos, a solução responsável e ética consiste em encaminhar o animal a outro estabelecimento veterinário. A sugestão é fazer analogia com a saúde humana: conforme o paciente (infantil, adulto, idoso, etc.), a especificidade do tratamento (nefrológico, cardiológico, etc.) e mesmo a gravidade (semi-intensivo, intensivo, etc.), o paciente humano pode ser destinado a outra unidade de saúde.
De acordo com as melhores práticas de biossegurança, os ambientes ideais de um setor de internação de uma clínica ou de um hospital veterinário de cães e gatos seriam: a) sala de procedimentos ou posto de enfermagem; b) sala para cães com processos infecciosos; c) sala para cães com processos não infecciosos; d) sala para gatos; e e) sala para gatos com processos infecciosos. Este artigo apresenta um detalhamento da operação dos ambientes e algumas considerações do setor de internação, visando que as orientações sejam mais bem compreendidas.
A sala de procedimentos pode ser um ambiente destinado a realizar as tarefas de identificação do paciente, canulação, tricotomia, medicação e outras, antes de se encaminhar o animal à baia ou ao alojamento na sala específica, conforme a necessidade. Um outro uso racional do espaço físico consiste em ter um posto de enfermagem que dê suporte logístico a todas as salas da internação, em vez de uma sala de procedimentos em um ambiente separado. Tanto a sala de procedimentos como o posto de enfermagem facilitam o fluxo de pacientes e da equipe, além do compartilhamento de móveis, equipamentos e outros. Um ponto de destaque na concepção desses espaços é a luminosidade diferencial sobre a mesa de procedimentos com média intensidade (maior do que a de salas de internação) e temperatura de cor branco-neutro ou branco-frio.
Segregar os cães por tipo de enfermidade é essencial para evitar infecção hospitalar, termo bem conhecido pela maioria dos tutores na sua relação de saúde pessoal ou familiar. Imagine um cão desidratado apresentar, alguns dias depois de retonar à casa do tutor, um quadro de hepatite infeciosa canina sem ter tido contato com nenhum outro cão fora do ambiente hospitalar. Provalmente se cogitará o fato de o animal ter contraído a infecção no estabelecimento veterinário, caso os cuidados com essa questão nesse espaço tenham sido inadequados. Em gatos, a distinção clínica baseada apenas nos sintomas iniciais de enfermidades infecciosas e não infeciosas é mais difícil; assim, recomenda-se uma sala geral de internação para gatos e outra para gatos infecciosos, uma vez que a enfermidade seja confirmada por exames laboratoriais.
Caso haja alojamentos verticais, as suas instalações e layout devem ser planejados. Ao projetar um alojamento vertical de animais, é crucial ter todas as medidas corretas, em todas as direções, e em especial a da altura. Não se pode querer fazer o uso máximo de uma sala e colocar três ou quatros alojamentos empilhados, em que no último andar os animais estejam em uma altura não ergonômica para os profissionais, com risco de o animal cair ao ser manipulado e que não permita a inspeção visual durante a estadia.
As demais dimensões também merecem atenção. Muitos veterinários pensam que é possível atender cães pequenos e gatos em um espaço apertado, mas isso constitui um engano. O espaço do alojamento deve permitir ao animal ficar em estação e que possa virar-se dentro dele. Assim, o estabelecimento deve ter alojamentos diferentes para portes diferentes. Além disso, é preciso cuidado na escolha dos materiais de construção dos alojamentos. Pode-se utilizar drywall, bastando prover impermeabilização adequada em todos os encontros, sendo essa medida um acabamento obrigatório também no piso de cerâmica ou porcelanato e nas paredes com pintura epóxi ou revestimento.
Ao escolher portinhas transparentes, deve-se usar obrigatoriamente vidro temperado, pois as de acrílico não toleram álcool como saneante e acabam por quebrar em um intervalo relativamente curto de tempo.
Ao planejar a montagem de uma internação intensiva, pode-se usar ou não carrinhos de transporte de animais de inox disponíveis no mercado.
Por fim, ao pesquisar produtos e equipamentos para montar um espaço de internação, é recomendável não se deixar impressionar com fotos atraentes de aplicativos que muitas vezes oferecem utensílios inadequados nos aspectos sanitário e ergonômico.
Apesar de não ser obrigatória, a sala de visita da internação pode constituir um grande diferencial. Esse ambiente segregado permite ao tutor visitar seu animal com maior comodidade e ao mesmo tempo auxilia na manutenção dos aspectos de segurança do paciente. O tutor fica em um ambiente separado, com a devida privacidade para manifestar suas emoções e crenças sem os distúrbios provocados pela presença de outros animais ou pelo trabalho da equipe. Além disso, a equipe veterinária mantém sua rotina de trabalho com os demais animais sem ser perturbada por visitantes, o que traz maior segurança ao paciente, uma vez que os erros de medicação são mais frequentes quando o processo é interrompido.
Os requisitos mínimos para o setor de internação incluem: a) mesa impermeável; b) pia de higienização; c) ambiente para higienização do paciente com disponibilização de água corrente; d) baias, boxes ou outras acomodações individuais de fácil higienização e compatíveis com os pacientes a elas destinadas; e) armário para guarda de medicamentos e materiais descartáveis; f) sistema de aquecimento para o paciente (colchão térmico, aquecedor de ambiente); e f) isolamento para pacientes com doenças infectocontagiosas. Quanto à última exigência, cumpre afirmar que o isolamento para animais com doenças infecciosas é obrigatório não apenas para as clínicas veterinárias que optarem por esse tipo de internação, mas para quaisquer hospitais veterinários.
Alguns cuidados adicionais incluem: a) proteção acústica dos demais ambientes, para permitir tranquilidade; b) uso de ar-condicionado para manutenção de temperatura confortável no ambiente; c) uso de exaustor para renovação do ar dentro do setor, promovendo ambiente com pressão negativa no setor infeccioso e mantendo pressão positiva no setor não infeccioso; d) luminosidade de baixa intensidade e branco-quente para alojamentos e corredores; e) luminosidade de média intensidade e branco-neutro ou frio para setor de procedimentos ou sob a mesa de procedimentos; f) tela milimétrica nas janelas; g) alguns pontos de oxigênio medicinal; h) aparelho de monitoramento; e i) bomba de infusão.
Apesar de a Resolução CFMV nº 1.275/19 permitir a recuperação anestésica dentro do setor de internação ou da sala de cirurgia, conforme citado no artigo publicado na edição 154, a existência de uma sala de indução e recuperação anestésicas própria para essa finalidade melhora a estrutura física. Dessa forma, o setor de internação fica restrito ao uso de animais que necessitem de cuidado intensivo ou semi-intensivo.
O setor de internação é classificado como área semicrítica; assim, a restrição de decoração é superior à de ambientes não críticos já abordados em artigos anteriores. Alguns aspectos gerais são semelhantes aos do bloco cirúrgico: paredes e pisos de fácil higienização com agentes químicos mais severos e com maior frequência, e objetos de iluminação embutidos (sempre que possível) ou sobrepostos com menor altura. Pode-se trazer as cores da logomarca, mantendo a identidade visual do estabelecimento dentro do setor de internação com a aplicação de faixas de cerâmica, azulejos ou pastilhas de vidro sem sobressalto. A aplicação de papel de parede e a presença de nichos com enfeites e outras opções decorativas da recepção, por exemplo, são proibidas.
A comunicação visual de cada ambiente do setor de internação é importante para direcionar corretamente o fluxo dos profissionais, além de ser útil aos médicos-veterinários do tipo volante.
Em resumo, o setor de internação tecnicamente projetado traz diferenciais marcantes para a excelência do atendimento médico-veterinário, possibilitando conforto e bem-estar aos animais, biossegurança (desinfecção de alto nível) e segurança operacional aos médicos-veterinários.