Um momento sempre crítico para qualquer tutor é a realização de uma cirurgia em seu animal, seja ela eletiva ou não, pois desperta uma série de preocupações. Novamente, o estabelecimento tem uma oportunidade de mostrar que se empenha em todos os aspectos, incluindo os ambientes restritos ao público.
O oferecimento dos serviços de cirurgia deve ser coerente com o espaço, os equipamentos existentes e a espécie animal. Um exemplo clássico é a cirurgia ortopédica, para a qual se recomenda uma sala de cirurgia de maior área do que a convencional (mínimo de 10 m2), por conta de equipamentos especiais que devem estar presentes (arco cirúrgico) ou serão trazidos para a sala (aparelho de radiografia móvel), de forma a permitir a visualização das estruturas ósseas para o posicionamento preciso dos dispositivos. Assim, a previsão dos tipos de intervenção cirúrgica que se pretende realizar em uma clínica ou em um hospital veterinários acaba por determinar o projeto do espaço.
Ao apresentar o valor de uma cirurgia, é costumeiro cobrar pelo uso do espaço do bloco cirúrgico, discriminando os diversos valores, como: 1) a medicação pré-anestésica, anestésica e de controle da dor; 2) os honorários médicos do cirurgião, do auxiliar e do anestesista; e 3) o espaço dedicado ao serviço de cirurgia. Como o tutor poderá questionar essa cobrança, pode-se apresentar todo o espaço técnico, seja por meio de fotos digitais, vídeo institucional ou visita in loco ao bloco cirúrgico. Essa ação diferencia de maneira clara para o tutor a estrutura física do estabelecimento e também implica que o médico-veterinário empreendedor planeje a reserva de uma quantia financeira para a manutenção e a modernização periódica do bloco cirúrgico.
Os ambientes de um centro cirúrgico são: sala de preparo, sala de recuperação, assepsia e paramentação (antecâmara), sala de lavagem e esterilização de materiais e, por fim, a sala de cirurgia.
A sala de preparo e a de recuperação podem ser um mesmo ambiente, denominado sala de indução e recuperação anestésicas, provido de oxigênio medicinal e aquecimento ao animal. É uma vantagem estar num ambiente integrado porque possibilita a facilidade do fluxo do paciente e dos profissionais, além do compartilhamento de móveis, equipamentos e outros. Esse ambiente deve contar, sempre que possível, com uma boa proteção acústica, para possibilitar o retorno anestésico tranquilo dos animais, sobretudo dos gatos. Outro ponto importante é a luminosidade adequada e diferente entre o local destinado ao procedimento (maior intensidade e temperatura branca, neutra ou fria) e à manutenção dos animais (menor intensidade e temperatura branco-quente).
A sala de assepsia e paramentação, também chamada de antecâmara, deve apresentar obrigatoriamente: lavatório cirúrgico de inox, dispensador de detergente e torneira acionáveis por fotossensor ou por meio de cotovelo, joelho ou pé, e nunca com acionamento manual. Deve atender um fluxo correto, com entrada por um corredor de acesso dentro do centro cirúrgico e direcionamento até a sala de cirurgia. Esse ambiente pode atender uma ou mais salas de cirurgia. A porta de acesso à antecâmara pode ter maçaneta e chave, mas a(s) porta(s) de acesso à(s) sala(s) de cirurgia deve ser sempre com dobradiça do tipo “bang-bang” (também chamada de vai e vem) ou ter acionamento automático, sem maçaneta.
A sala de lavagem e esterilização de materiais deve contar obrigatoriamente com autoclave para o procedimento de esterilização, não sendo mais, há alguns anos, aceito o uso de estufa. Deve conter ainda um tanque de inox ou de cerâmica para lavagem do instrumental cirúrgico, bancada para acomodar banho desincrustante, gabinete para guardar materiais de identificação e embalagem do instrumental, e armário para guardar o material já esterilizado. É interessante apresentar uma caixa de passagem (do inglês pass-through) para transferência do material esterilizado para o usuário final (médico-veterinário cirurgião) da sala de assepsia e paramentação para a sala cirúrgica. Essa caixa pode ser adquirida comercialmente, sendo de inox ou de madeira com superfícies revestidas por laminado melamínico, ou até mesmo ser feita em alvenaria, com revestimentos adequados (pintura epóxi, porcelanato sem emendas) e portas de vidro (temperado). A sala de lavagem e esterilização de materiais é um ambiente dispensável, desde que a empresa tenha contrato de terceirização específico para essa finalidade.
Um ambiente adicional não obrigatório é o vestiário de barreira, que auxilia a manutenção dos aspectos de biossegurança dos estabelecimentos. A equipe veterinária deixa seus vestuários de uso clínico ou comum no armário, além dos calçados, para colocar roupa esterilizada do estabelecimento e calçado higienizado. Recomenda-se a implantação do vestiário de barreira em área adjacente à antecâmara.
Os requisitos mínimos para a sala de cirurgia incluem: a) mesa impermeável; b) iluminação emergencial própria (preferencialmente bloco de aclaramento e não de balizamento); c) climatização por ar condicionado; d) foco cirúrgico; e) tela milimétrica nas janelas (quando presentes); f) mesa auxiliar; g) ponto de oxigênio medicinal; h) equipamento para aquecimento do animal (colchão térmico); i) equipamento de anestesia (não opcional); e j) equipamento de monitoramento (não opcional).
Alguns cuidados adicionais incluem: a) proteção acústica dos demais ambientes e do logradouro; b) troca de ar por meio de exaustor, para permitir a renovação do ar dentro da sala; c) luminosidade de alta intensidade com temperatura de cor neutra; e) portas sem maçanetas (desde aquela porta de acesso do animal a partir de corredor ou da sala de indução e recuperação anestésicas ou a porta da antecâmara); e f) cantos arredondados nos encontros entre parede e piso e entre parede e parede.
O bloco cirúrgico é classificado como área crítica; assim, a restrição de decoração é superior a todos os ambientes não críticos ou semicríticos já abordados nos artigos anteriores. Alguns aspectos gerais são: a) paredes e pisos de fácil higienização e resistentes a agentes químicos mais severos usados com maior frequência; b) objetos de iluminação embutidos (sempre que possível) ou sobrepostos com menor altura. Há uma grande dificuldade relativa ao conceito de paredes de fácil higienização; sendo assim, a maioria dos estabelecimentos aplicam azulejos ou cerâmicas brancas nas paredes, mas é possível usar pintura epóxi (preferencialmente à base de solvente) de cor clara, com aplicação de faixas de cerâmica, azulejos ou pastilhas de vidro sem ressalto. Dessa forma, é possível trazer as cores da logomarca mantendo a identidade visual do estabelecimento dentro do centro cirúrgico.
A comunicação visual de cada ambiente do bloco cirúrgico é importante para sua identificação, sobretudo quando existem profissionais do tipo volante, sendo mais comum na porta, mas podendo ser próxima a ela.
O bloco cirúrgico tecnicamente projetado traz diferenciais marcantes tanto para o tutor como para a equipe veterinária. Um bloco cirúrgico bem projetado e executado possibilita pré e pós-operatórios de excelência, biossegurança e comodidade aos médicos-veterinários e aos animais.