Estadiamento da doença renal crônica em gatos e cães
A doença renal crônica (DRC) é uma doença encontrada mais frequentemente em gatos e cães idosos e considerada uma das principais causas de óbito nesta fase de vida;
Embora possa ocorrer em animais mais jovens como uma doença adquirida (por exemplo, uma sequela de lesão renal aguda), ou de forma congênita (por exemplo, a displasia renal).
Trata-se de uma doença irreversível, progressiva e, na maioria das vezes, não há sinais óbvios associados a essa patologia, especialmente nos estágios iniciais. No entanto, o médico-veterinário desempenha um papel fundamental em retardar sua progressão; em primeiro lugar, detectando a DRC em um estágio inicial e, em segundo lugar, instituindo mudanças dietéticas apropriadas (juntamente da terapia clínica convencional, quando necessária). Ao fazer isso, ele pode melhorar a expectativa e a qualidade de vida de gatos e de cães que sofrem de DRC.
A progressão da DRC foi descrita em quatro estádios, resultados de um processo degenerativo com acometimento progressivo da função renal e perda de néfrons. O atual modelo de estadiamento da DRC em cães e gatos foi proposto pela International Renal Interest Society (IRIS) e endossado pela European Societies for Veterinary Nephrology and Urology (ASVNU and ESVNU).
A base para estadiamento é a concentração de creatinina plasmática. O grupo IRIS destaca as limitações desta abordagem, uma vez que a concentração de creatinina plasmática pode ser influenciada por: massa muscular, estado de hidratação e composição da dieta. De acordo a última atualização da IRIS 2019, no estádio 1 da DRC é possível identificar aumento na concentração de dimetilarginina simétrica (SDMA), apesar de não haver aumento de ureia e creatinina sanguíneas, além do valor de densidade urinária abaixo do esperado para cada espécie.
Nos estágios mais avançados, são identificadas alterações nos parâmetros sanguíneos, como azotemia, acidose metabólica, hipocalemia, hipernatremia, anemia não regenerativa, hiperfosfatemia e hiper ou hipocalcemia.
De forma resumida temos:
– Estádio 1: definido pela creatinina e SDMA dentro de seus respectivos intervalos de referência (creatinina <1,4 mg / dL para cães ou <1,6 mg / dL para gatos, SDMA <18 µg / dL para cães e gatos), mas associada aos sinais clínicos.
– Estádio 2 a 4: correspondentes a valores crescentes de creatinina e SDMA, acima de seus respectivos limites de referência associado a uma diminuição da densidade urinária (<1,030 para cães e < 1,035 para gatos).
Uma vez estadiado, o paciente é subestadiado de acordo com: hipertensão arterial sistêmica e relação proteína/creatinina urinária. A presença de proteína na urina é uma das consequências da perda de função renal e tem sido associada a um pior prognóstico e progressão mais rápida da DRC do que em pacientes que não apresentam proteinúria.
A nutrição adequada é a base do tratamento da DRC: retarda a progressão da doença auxilia na melhora na qualidade de vida dos pacientes. As mais recentes recomendações sugerem o fornecimento de alimento específico com redução no teor de fósforo (como aqueles destinados aos animais idosos) para pacientes no estádio 1 da DRC com ausência de proteinúria. Para gatos e cães com DRC em estádios 2, 3 e 4, ou que apresentem proteinúria em qualquer estádio da DRC, recomenda-se o oferecimento de alimentos coadjuvantes específicos para doença renal que contenham valores restritos de fósforo em sua composição e controle do teor de proteína.
Inserir o alimento úmido na rotina do paciente com DRC é um fator chave para auxiliar na sua hidratação, por isso, recomenda-se que o alimento úmido faça parte da alimentação do gato e do cão desde a fase filhote, para que ele se acostume com diferentes texturas e tenha melhor aceitação do alimento quando adulto e idoso. Estimular esta textura de alimentação ainda quando filhote pode ser muito benéfico quando focamos na prevenção.
Por fim, para animais com DRC, as alterações dietéticas devem ser iniciadas no início da doença e, posteriormente, ajustadas às necessidades individuais do paciente, com base no monitoramento dos parâmetros físicos e laboratoriais. O médico-veterinário é o mais apto para escolher a dieta mais apropriada, conforme estado geral e histórico clínico do paciente.
Referências sugeridas
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