O período neonatal, que abrange desde o nascimento até cerca de três semanas de idade, é uma fase de extrema vulnerabilidade para filhotes de gatos e cães. Durante esse período, os neonatos são fisiologicamente imaturos e dependem totalmente dos cuidados maternos e das condições ambientais.
A mortalidade neonatal é alta, com cerca de 20% dos filhotes não sobrevivendo até os dois meses de vida, principalmente nas primeiras 48 horas. Para reduzir essa taxa e promover um desenvolvimento saudável, é crucial que o médico-veterinário, junto aos criadores, esteja atento a uma série de cuidados essenciais.
Imunidade passiva
Imediatamente após o nascimento, a ingestão de colostro é vital, pois fornece aos neonatos os anticorpos maternos (imunoglobulinas) essenciais para protegê-los contra infecções.
A absorção dessas imunoglobulinas ocorre de forma mais eficiente nas primeiras horas de vida, sendo crucial que os filhotes se alimentem o quanto antes. Após 12 a 16 horas, a eficiência de absorção cai drasticamente, e a partir de 24 horas, a barreira intestinal está completamente fechada. A falha na transferência de imunidade passiva pode resultar em maior suscetibilidade a doenças e ao aumento do risco de mortalidade.
Higiene do ambiente
A higiene do ambiente também é essencial para prevenir infecções, uma vez que os filhotes nascem com imunidade limitada. O uso de luvas descartáveis ao manusear os neonatos é recomendado para minimizar a exposição a patógenos. Além disso, o comportamento materno deve ser monitorado de perto. Estresse excessivo pode resultar em rejeição ou até canibalismo dos recém-nascidos.
Peso corporal
A monitoração do peso dos filhotes é fundamental. Eles devem ser pesados diariamente até a terceira semana e, posteriormente, em dias alternados para garantir um crescimento adequado. Ausência de ganho ou perda de peso requerem intervenção imediata.
Temperatura corporal
Os filhotes neonatos são incapazes de regular sua própria temperatura corporal, o que torna o controle térmico do ambiente crucial para a sobrevivência. Bolsas de água quente, lâmpadas infravermelhas ou incubadoras pediátricas são indicadas para manter uma temperatura estável.
Leite materno
A composição nutricional do leite é suficiente para o crescimento e o desenvolvimento normais até cerca de 4 semanas de idade. E por isso a nutrição da mãe durante a lactação é um fator determinante para a quantidade e a qualidade do leite materno. A dieta fornecida à fêmea afeta, por exemplo, as concentrações de ácido docosaexaenoico (DHA) no leite. O DHA é fundamental para o desenvolvimento neural dos filhotes e está associado a um melhor desempenho visual.
Durante a lactação, as demandas energéticas das gatas e das cadelas aumentam significativamente em relação às necessidades de manutenção. Recomenda-se também que a mãe seja alimentada ad libitum, para atender às suas maiores demandas energéticas, pois estima-se que as necessidades alimentares sejam de 1,5 a 2 vezes a manutenção na primeira semana, 2 vezes na segunda semana e de 2,5 a 3 vezes na terceira e quarta semanas de lactação.
Sucedâneo do leite
Filhotes órfãos ou com mães que não produzam leite suficiente devem receber alimentação artificial com fórmulas comerciais específicas para gatos ou cães. Leite de vaca ou cabra não é recomendado, pois pode resultar em distúrbios gastrointestinais e crescimento deficiente. A alimentação com mamadeira ou sonda deve ser realizada de 4 a 6 vezes ao dia, com uma frequência maior nas primeiras semanas.
O período neonatal exige vigilância constante e cuidados específicos. O médico-veterinário desempenha um papel essencial na orientação de criadores, monitorando aspectos como a ingestão de colostro, o ganho de peso, a temperatura corporal e a higiene do ambiente. Com uma abordagem detalhada, é possível reduzir a taxa de mortalidade neonatal e promover um desenvolvimento saudável durante essa fase crítica.
Referências sugeridas
CHASTANT-MAILLARD, S. et al. Guia prático de neonatologia para criadores de cães e gatos: as três primeiras semanas de vida – um período crítico para filhotes caninos e felinos. Royal Canin, 2017.
DANIEL, A. G. T. et al. Guia prático de obstetrícia e pediatria felina. São Paulo, Brasil: Royal Canin, 2023.
GAILLARD, V & PÉRON F. Cuidados neonatais e pediátricos de gatos e cães: um guia prático para médicos-veterinários, Royal Canin, 2024.
GRANDJEAN, D at al. Dog breeding: practical guide. Aimargues, France: Aniwa SAS on behalf of Royal Canin, 2006.
Leticia Tortola
Coordenadora de Comunicação Científica –
Royal Canin do Brasil