Conselho Nacional de Proteção e Defesa do Bem-estar dos Animais (Conapra)
Quanto tempo ainda vamos esperar?
O Projeto de Lei
O Projeto de Lei do Senado – PLS n° 650 (Social/Meio Ambiente – https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/123360), submetido em 29/9/2015, dispunha sobre a proteção e a defesa do bem-estar dos animais, definia conceitos como maus-tratos e outros (ainda hoje ambíguos), e criava duas instâncias federais de forma pioneira, ambas ancoradas no Ministério do Meio Ambiente: o Sistema Nacional de Proteção e Defesa do Bem-estar dos Animais (Sinapra) e o Conselho Nacional de Proteção e Defesa do Bem-estar dos Animais (Conapra).
Submetido pela então senadora Gleisi Hoffmann (PT/PR), ele não foi votado e infelizmente foi arquivado ao final de legislatura da senadora (art. 332 do Risf) em 21/12/2018.
Mesmo após esse arquivamento, o projeto poderia ter sido reapresentado no Senado por algum senador em mandato atualmente, mas não foi. Ele ainda pode ser apresentado como Projeto de Lei (PL) na Câmara de Deputados pela própria ex-senadora, atualmente no mandato de deputada federal, ou por quaisquer dos demais deputados federais que foram eleitos com a responsabilidade de proteger o bem-estar dos animais.
Enquanto essa legislação não é aprovada, a população humana e animal aguarda leis que permitam ações eficientes de proteção e bem-estar animal.
O projeto n° 650 alterava também a Lei nº 7.173/83, que dispunha sobre o estabelecimento e o funcionamento de jardins zoológicos; a Lei no 9.605/98, que determinava as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente; e a Lei no 11.794/08, que estabelecia procedimentos para o uso científico de animais; e revogava a Lei nº 10.519/02, que dispunha sobre a promoção e a fiscalização da defesa sanitária animal quando da realização de rodeios.
A seguir, alguns pontos ainda controversos que poderiam ser todos discutidos em instâncias específicas no âmbito federal, e que poderiam ser também repassados ou discutidos nas esferas estaduais e municipais.
Direito dos animais ao bem-estar
No Art. 6º, “todos os animais têm direito à existência em um contexto de equilíbrio biológico e ambiental, de acordo com a diversidade das espécies, raças e indivíduos”, ou seja, de preservação da integridade física e mental e do bem-estar dos animais, que seriam considerados interesse difuso, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de protegê-los e de promover ações que garantam o direito estabelecido no caput, além de coibir práticas contrárias à lei. Assim, segundo o Art. 7º, toda pessoa física ou jurídica que mantenha animal sob sua guarda deverá tomar todos os cuidados necessários para prover a ele condições mínimas de bem-estar.
Vedação dos maus-tratos
Segundo o Art. 8°, seriam vedadas quaisquer formas de maus-tratos aos animais, considerando-se maus-tratos, sem prejuízo de outras condutas decorrentes de ação ou omissão, dolosa ou culposa, direta ou indireta, expor o animal a perigo ou a danos diretos ou indiretos à vida, à saúde e ao seu bem-estar, inclusive a doenças infectocontagiosas e que possam ser consideradas e constatadas por autoridade sanitária, policial ou judicial.
Nesse tópico, é inovadora a atenção ao comportamento de acumulação compulsiva de animais, considerando-se maus-tratos, segundo o item XXVI, “acumular animais de forma compulsiva, com número exagerado de animais de estimação, sem ter como abrigá-los ou alimentá-los de forma adequada, mesmo sem crueldade deliberada”.
Políticas públicas de proteção do bem-estar dos animais
Segundo o Art. 9º, o Poder Público adotaria ações e políticas voltadas à proteção e ao bem-estar dos animais de acordo com as diretrizes propostas, promovendo políticas de conscientização para a prevenção e o combate aos maus-tratos e para a guarda responsável de animais.
A inovação consiste em estimular a educação e a orientação de profissionais voltados à proteção e ao bem-estar dos animais, bem como incentivar e fomentar a abertura de hospitais veterinários para atendimento gratuito de animais que necessitem de cuidados e serviços médicos, preferencialmente vinculados às instituições de ensino superior em medicina veterinária.
Fim do uso de animais em espetáculos
Na Seção VII, do Uso de Animais em Espetáculos, o Art. 21 vedaria a exibição, o uso e a manutenção de animais em circos, exibições de lutas, casas de espetáculos ou semelhantes, e pelo Art. 22. estaria vedada a realização de rodeios, touradas, vaquejadas ou eventos similares que envolvessem maus-tratos e atos cruéis aos animais. Excluíam-se das atividades previstas a exposição de animais e sua utilização em provas hípicas, procissões religiosas, desfiles cívicos ou militares ou em atividades similares que não lhes causassem danos e não configurassem maus-tratos.
Criação do Conselho Nacional de Proteção e Defesa do Bem-estar dos Animais (Conapra)
No Art. 35, o PLS criaria o “Conselho Nacional de Proteção e Defesa do Bem-estar dos Animais (Conapra), órgão integrante da estrutura do Ministério do Meio Ambiente, de caráter consultivo e de assessoramento na formulação e avaliação de políticas públicas, constituindo espaço de articulação entre as esferas de governo e a sociedade civil e de controle social das ações voltadas ao bem-estar dos animais e sua interação com o meio ambiente e a população humana”.
O Conapra teria como função “promover a articulação, a cooperação e a integração dos órgãos e entidades da administração pública federal, e desses com as demais esferas de governo e entidades privadas com ou sem fins lucrativos, que tenham, no âmbito de suas competências, políticas, programas e ações que impactem a vida e o bem-estar dos animais, sua utilização pelo homem e suas interações com o meio ambiente e com a população”.
Segundo o Art. 42, o Conapra convocaria, em periodicidade não superior a quatro anos, a Conferência Nacional de Proteção e Defesa do Bem-estar dos Animais, com o objetivo de indicar diretrizes e prioridades para as políticas e ações voltadas para a proteção e defesa do bem-estar dos animais e sua interação com o meio ambiente e a população humana, e fomentar a participação e o controle social.
Infrações e penalidades relativas a maus-tratos aos animais
De acordo com o Art. 43, constituía “infração à proteção e defesa do bem-estar dos animais toda ação ou omissão que importe em ato de abuso ou maus-tratos, na inobservância de preceitos estabelecidos nesta Lei, especialmente no art. 8º, ou na desobediência às determinações de caráter normativo dos órgãos e das autoridades administrativas competentes”.
As penas variariam compreendendo advertência, prestação de serviços voltados à promoção do bem-estar animal, prestação pecuniária (contribuições financeiras), multa de um quarto do salário-mínimo a 13 mil salários-mínimos, apreensão do animal e dos instrumentos, perda definitiva da guarda, posse ou propriedade do animal, proibição de guarda, posse ou propriedade de animais e reclusão com pena aumentada de metade em caso de lesão grave permanente ou mutilação, e ainda aumentada em dobro em caso de morte do animal.
Cabe lembrar que não existe na legislação brasileira lei que proíba a guarda, posse ou propriedade de animais em consequência de maus-tratos, como acontece em vários outros países.
Mudança da razão social dos zoológicos
Segundo o Art. 50, caberia ao Ministério do Meio Ambiente, “no prazo de dois anos e, posteriormente, a cada cinco anos, averiguar as condições dos zoológicos existentes, determinando sua continuidade ou o encerramento de suas atividades, tomando as providências devidas para a proteção da vida e do bem-estar dos animais envolvidos”.
Os zoológicos que permanecessem em atividade, na forma do parágrafo anterior, deveriam promover obrigatoriamente programas continuados de preservação da fauna nativa brasileira, de combate ao tráfico de animais selvagens, de prevenção de riscos de introdução de fauna exótica, de educação e sustentabilidade ambiental.
Além disso, não seria permitida a aquisição de novos animais para o acervo de zoológicos, ressalvados os casos de animais provenientes de apreensões, doações, em condições de maus-tratos, acidentados, mutilados ou que não pudessem mais ser devolvidos ao seu habitat natural, mediante autorização do órgão competente.
Finalmente, ficaria proibida a reprodução intencional de animais exóticos para o acervo de zoológicos sem prévia autorização do órgão competente.
Considerações finais
Projetos de Lei como o n° 650, arquivados, precisam ser recolocados em debate, pois são oportunidades de se tornarem as leis tão necessárias em nosso país.
É importante que esse projeto seja reapresentado, pois, enquanto isso, carecemos de uma instância federal que oriente os estados e municípios numa ação coordenada e padronizada de proteção e bem-estar animal.