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Aplicabilidade de softwares de gestão integrada na medicina veterinária do coletivo

Como a tecnologia pode contribuir na gestão de abrigos de animais?

Matéria escrita por:

Leandro Chiarelli Alves, Alexander Welker Biondo

11 de jan de 2021

Apesar de os abrigos não terem fins lucrativos, a harmonia das relações entre as pessoas, os processos e o gerenciamento dos produtos deve ser indissociável, como na iniciativa privada. Créditos: Fernando Fonsales Apesar de os abrigos não terem fins lucrativos, a harmonia das relações entre as pessoas, os processos e o gerenciamento dos produtos deve ser indissociável, como na iniciativa privada. Créditos: Fernando Fonsales

Tecnologia da informação e gestão organizacional

A utilização da tecnologia da informação (TI) tem sido essencial para o pleno desenvolvimento de organizações e entidades públicas de proteção animal e ambiental, uma vez que possibilita a reestruturação da gestão dos processos organizacionais nos mais diversos níveis e setores de atuação profissional, implicando a melhora da capacidade de atendimento de empresas públicas, privadas e de organizações não governamentais (ONGs) 1-3.

A evolução tecnológica tem possibilitado a rápida difusão do conhecimento via internet e a identificação mais ágil de fatores que afetam o mercado. Conceitos de TI, aliados à transparência de recursos, permitem controlar melhor o patrimônio público por meio de ferramentas de gestão organizacional e monitoramento remoto, com consequente melhora da efetividade do serviço público e das parcerias privadas no âmbito da proteção animal 4.

A gestão organizacional pode ser dividida em quatro grandes áreas: gestão de pessoas, de comportamento, estratégica e de recursos humanos 5. A aplicação dos recursos de informática na gestão empresarial pode ser feita por meio de sistemas de call center, autoatendimento, notificação e monitoramento remoto via aplicativo, assim como de banco de dados e metadados e armazenamento em nuvem 6.

Os sistemas de gestão integrada são ferramentas administrativas que contribuem para a melhora do desempenho das empresas no que concerne às questões relacionadas ao meio ambiente, à qualidade do serviço prestado, a pesquisas e desenvolvimento de produtos e serviços e à responsabilidade social, entre outras 7. A adoção desses sistemas, além de auxiliar a gestão e melhorar o serviço prestado, amplia a visão das pessoas sobre a qualidade e o alcance desse serviço.

A utilização de softwares de gestão integrada é de suma importância para a organização dos serviços – devido à exigência do público por maior celeridade, na aplicação plena dos sistemas de gestão integrada, na disponibilização de dados para os pesquisadores e os gestores dos recursos –, bem como para auxiliar e dar maior fidelidade à alimentação desses dados por parte dos colaboradores 8.

A integração de sistemas e a informatização podem ser feitas por meio de portais corporativos (intranet) que integrem os dados estruturados e os não estruturados, e que forneçam as informações dos bancos de dados em uma interface individualizada. Esses portais podem ter conexão direta ou indireta com os sites dos serviços de proteção animal que disponibilizem dados de transparência de gestão 9,10.

 

Aplicações básicas de softwares de gestão integrada nos abrigos de animais

À medida que a proteção animal se torna mais presente na sociedade, veterinários que utilizem recursos tecnológicos garantem um melhor controle dos dados e da gestão dos recursos financeiros, sejam eles públicos ou privados 11. Utilizando softwares integrados por bancos de dados locais e nuvem, é possível conectar a atuação do sistema em abrigos e o poder público, permitindo uma comunicação simplificada e direta entre protetores e órgãos reguladores da proteção animal 12.

A integração desses programas pode ser feita também por meio de softwares de aplicação (APPs), em smartphones conectados às redes móveis. Em situações de resgate e captura de animais em vulnerabilidade ou de registro de ocorrências, esse formato permite ao operador alimentar facilmente o banco de dados com informações sobre a classificação da situação e o tipo de ocorrência (maus-tratos, zoofilia, atropelamentos, abandono, etc.), a localização por GPS (Global Positioning System), a audiodescrição da ocorrência e imagens do animal em tempo real 13.

Esses softwares ainda possibilitam fornecer de maneira objetiva informações sobre dados críticos disponibilizados em sites de ONGs e do poder público que podem ser livremente consultados. A notificação de surtos, epidemias, zoonoses e vazios sanitários, assim como o fornecimento de informações sobre locais de acidentes, eutanásias ou outras ocorrências de importância à saúde pública e à causa animal, são exemplos dos dados que poderão ser disponibilizados nesses sites 14.

Outras aplicabilidades desses softwares em abrigos incluem a organização da estimativa da população animal por localidade, a administração de campanhas de adoção e de esterilização, a promoção à saúde animal e ações educativas, bem como o aumento da captação de voluntários, um melhor gerenciamento de materiais de apoio e de recursos financeiros provenientes de doações. Além disso, a utilização específica desses recursos permite que se monitore com mais eficiência todas as variáveis envolvidas em cada processo, como no caso de adoções, visitações, cadastro de lares temporários, perfis dos adotantes e dos adotados, devoluções e rastreamento de animais microchipados entre recintos privativos, coletivos, de isolamento ou em quarentena 15.

Dessa forma, apesar de os abrigos não visarem fins lucrativos, também deve ser indissociável a harmonia das relações entre pessoas (colaboradores), processos (protocolos de ação) e produtos (efetividade de ações), tal como na gestão de negócios na iniciativa privada, para que as práticas de proteção animal e de promoção à saúde única e ao bem-estar animal sejam bem-sucedidas 16-18.

 

Realidade Brasil vs. Estados Unidos e softwares disponíveis no mercado

Analisando as diretrizes de alguns abrigos dos Estados Unidos, é possível compreender a efetividade desses programas perante a dinâmica do controle populacional, bem como da promoção de bem-estar animal nos abrigos. De maneira geral, o abrigo é pensado como um negócio, e por isso o planejamento central é o primeiro passo a realizar. Todos os detalhes relacionados a estrutura física, fluxo de animais, enriquecimento ambiental, adoção, visitações, lares temporários, programas de voluntariado, doações e até mesmo a localização do abrigo são levados em consideração nessas diretrizes 16-19. Outro ponto fundamental a analisar é a capacity for care (C4C), expressão que define a capacidade de atendimento do abrigo associada à capacidade orientada de adoção, sendo esse o fator que define a população presente no abrigo 17,18,20.

Em um estudo no qual foi avaliada a situação de bem-estar dos cães mantidos em abrigos municipais no estado do Paraná, os autores afirmam que na maioria dos abrigos há falhas de gestão na manutenção dos animais, de acordo com o protocolo Shelter Quality 21. Como o Paraná é atualmente a quinta economia dos estados brasileiros, a situação da gestão de abrigos em outros estados talvez seja semelhante ou mesmo pior.

É possível observar o nível de improviso com que é feita a manutenção dos abrigos animais 22. A partir dessa observação, podemos ser capazes de afirmar que a fonte desse problema está onde nascem as iniciativas de proteção animal no nosso país, tendo como característica comum a atuação individualizada e descontrolada relativa à coleta dos animais de rua executada por abrigos improvisados sem uma análise de C4C. Dessa forma, a capacidade de suporte é sempre superada, e a ação de proteção animal, inicialmente bem-intencionada, pode redundar em uma situação de acúmulo de animais que cause mal-estar e riscos à saúde individual e coletiva para colaboradores, sociedade e animais, e até mesmo gere agravos ambientais em longo prazo.

Analisando as diretrizes da Associação Veterinária de Medicina de Abrigos (Association of Shelter Veterinarians – ASV) 19, é possível observar a ênfase que se dá à gestão dos abrigos. Realizando uma pesquisa rápida no capterra.com (site de pesquisa de softwares), é possível identificar alguns dos principais programas utilizados por abrigos dos Estados Unidos, da África do Sul, do Reino Unido e do Canadá. O custo da licença de uso desses softwares varia da gratuidade até 340 dólares mensais ou 1.000 dólares por licença vitalícia. As principais ferramentas destacadas são: Animal Shelter Manager, Barrk, The Pet Friend, ShelterBuddy, Animalog, Animals First, Paw Trax, Pawlitics, PetPal Manager, Shelterluv e Shelter Pro. A maioria dos softwares são plataformas baseadas em nuvem, sendo que alguns podem ser instalados e operar offline, em máquinas que funcionem com sistema Windows ou Macintosh. O serviço de suporte desses sistemas pode ser remoto, sendo alguns em horário comercial do país de origem, porém o Pawlitics e o ShelterBuddy oferecem suporte 24 horas. Esses programas também permitem a formação continuada dos profissionais, que pode ser realizada a partir de documentos, webinars, formação pessoal ou aulas ao vivo online. Animal Shelter Manager, The Pet Friend, PetPal Manager e Shelterluv são as plataformas que apresentam disponibilidade de acesso por APP em celulares Android ou iOS.

 

Considerações finais

Trazer a TI para a realidade de abrigos permite ampliar serviços com maior eficiência, integrando a proteção animal, o poder público e a sociedade. Para isso, a informatização de abrigos não deve ser vista de forma superficial, como a utilização básica de computadores e planilhas eletrônicas, mas sim como a combinação de ferramentas complexas e sobretudo essenciais para a geração de informações e ações efetivas nesse contexto.

Analisar as funcionalidades de cada software pode ser extenuante, porém eles oferecem uma gama de ferramentas que podem ou devem estar disponíveis em uma plataforma de gestão integrada e que possam ser empregadas em abrigos de animais. Essas plataformas devem oferecer suporte e treinamento integrado aos colaboradores do abrigo, a fim de auxiliar na captação de recursos por doações, bem como na transparência dos dados gerados pelo abrigo, otimizando a utilização dos recursos e promovendo maior efetividade das ações de proteção animal.

Mesmo sem visar ganhos financeiros, uma gestão efetiva de abrigos proporciona à sociedade uma satisfação maior com os programas de proteção animal, permitindo uma aplicação mais célere de ações que visem melhorar as condições dos animais e aumentar sua capacidade de gerar novas adoções. Envolve diretamente a satisfação dos funcionários e colaboradores, diminuindo a ineficiência e a frustração, e aumenta o alcance das ações, favorecendo as pessoas engajadas na causa animal em todos os níveis.

 

Referências

01-MORAES, G. D. A.; TERENCE, A. C. F.; ESCRIVÃO FILHO, E. A tecnologia da informação como suporta à gestão estratégica da informação na pequena empresa. Revista de Gestão da Tecnologia e Sistemas da Informação, v. 1, n. 1, p. 27-43, 2004. ISSN: 1807-1775.

02-ANDRADE, M. A. R. A importância dos sistemas de informação para os processos nas organizações. In: SIMPÓSIO DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO E TECNOLOGIA, 2016, Resende, RJ. Anais… Resende: Associação Educacional Dom Bosco, 2016.

03-NGÚVULO, S. Concepção de um sistema informático de gestão do pessoal do ISCED– Cabinda. 2016. Dissertação (Mestrado em Engenharia Informática) – Universidade Fernando Pessoa, Porto, Portugal, 2016. 

04-ROSSETI, A. G.; MORALES, A. B. T. O papel da tecnologia da informação na gestão do conhecimento. Ciência da Informação, v. 36, n. 1, p. 124-135, 2007.

05-FISCHER, A. L. A constituição do modelo competitivo de gestão de pessoas no Brasil – um estudo sobre as empresas consideradas exemplares. 1998. 391 f. Tese (Doutorado em Administração) – Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1998.

06-PRADO, A. A utilização de recursos de informática na gestão de RH em pequenas e médias empresas. Administradores.com, 2019. Disponível em: <https://bit.ly/3gFy290>. Acesso em 20 de julho de 2020.

07-MORAES, C. S. B.; VALE, N. P.; ARAÚJO, J. A. Sistema de Gestão Integrado (SGI) e os benefícios para o setor siderúrgico. Revista Metropolitana de Sustentabilidade, v. 3, n. 3, p. 29-48, 2013. ISSN: 2318-3233.

08-FERNANDES, J. L. S. BUSANELLO, F.; POLACINSKI, E.; GODOY, L. P.; LOSEKANN, A. G.; LORENZETT, D. B. Etapas necessárias para a implantação de um sistema de gestão integrado. Revista de Administração da Universidade Federal de Santa Maria, v. 8, n. 1, p. 60-72, 2015. doi: 10.5902/198346596286.

09-BONATO, S. V.; CATEN, C. S. T. Diagnóstico da integração dos sistemas de gestão ISO 9001, ISO 14001 e OHSAS 18001. Production, v. 25, n. 3, p. 626-640,  2015. doi: 10.1590/0103-6513.004811.

10-DIAS, C. A. Portal corporativo: conceitos e características. Revista Ciência da Informação, v. 30, n. 1, p. 50-60, 2001. doi: 10.1590/S0100-19652001000100007.

11-LIMA, P. A. Software para gestão de petshop e clínica veterinária. 2015. 63 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Informática e Cidadania) – Universidade Federal do Paraná, Matinhos, PR, 2015.

12-RANGEL, A. Interbase 7 – desenvolvendo e administrando banco de dados. Rio de Janeiro: Alta Books, 2003. 189 p. ISBN: 979-8588745840.

13-AMORIM, D. F. B. Softwares de sistemas e de aplicações livres: benefícios e limitações no uso dessas tecnologias nos negócios. Revista Científica Semana Acadêmica, v. 1, n. 69, p. 1-19, 2015. ISSN: 2236-6717.

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15-OLIVEIRA, G. Software para gerenciamento de animais em ONGS. Prezi, 2015. Disponível em: <https://bit.ly/3ihTtgE>. Acesso em 8 de agosto de 2020.

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17-KSMP. Calculating shelter capacity. Koret Shelter Medicine Program, 2015. Disponível em: <https://bit.ly/3g1On6y>. Acesso em 14 de agosto de 2020.

18-KSMP. Overview of Capacity for Care (C4C). Koret Shelter Medicine Program, 2016. Disponível em: <https://bit.ly/31YuuIP>. Acesso em 14 de agosto de 2020.

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20-NEWBURY, S.; HURLEY, K. F. Population management In: MILLER, L.; ZAWISTOWSKI, S. Shelter medicine for veterinarians and staff.  2. ed. Iowa: John Wiley & Sons, 2012. p. 93-113. ISBN: 978-0813819938.

21-ARRUDA, E. C.; GARCIA, R. C. M.; OLIVEIRA, S. T. Bem-estar dos cães de abrigos municipais no estado do Paraná, Brasil, segundo o protocolo Shelter Quality. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v. 72, n. 2,  p. 346-354, 2020. doi: 10.1590/1678-4162-11323.

22-ARRUDA, E. C.; NORONHA, J.; MOLENTO, C. F. M.; GARCIA, R. C. M.; OLIVEIRA, S. T. Características relevantes das instalações e da gestão de abrigos públicos de animais no estado do Paraná, Brasil, para o bem-estar animal. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v. 71, n. 1, p. 232-242, 2019. doi: 10.1590/1678-4162-10224.